Famílias podem exigir vagas em creches e pré-escolas do Estado, decide Supremo

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A educação básica em todas as suas fases é um direito fundamental de crianças e jovens e dever do Estado. Dessa maneira, famílias podem exigir vagas em creches e pré-escolas. Esse foi o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, por unanimidade, na sessão desta quinta-feira (22/9).

O relator do recurso extraordinário sobre o tema, ministro Luiz Fux, alegou que o direito à educação infantil é previsto na Constituição Federal de 1988. “O Estado tem o dever constitucional de garantir o efetivo acesso e atendimento em creche e unidade de pré-escola, sob pena de configurar-se inaceitável omissão estatal e violação a direito subjetivo sanável pela via judicial.”

O relator também destacou que a jurisprudência da corte vem se firmando no sentido de exigir a efetivação plena do direito à educação infantil, cuja prestação não se insere no poder discricionário da administração pública.

Fux ressaltou que o acesso à educação pública de qualidade na primeira infância ajuda no desenvolvimento das capacidades cognitivas das crianças, o que faz com que elas estudem por mais tempo e, consequentemente, beneficia a sociedade como um todo.

Todos os demais ministros seguiram o relator no entendimento de que é dever do Estado assegurar creche e pré-escola às crianças de até cinco anos. No entanto, houve divergências quanto à tese a ser fixada.

Na sessão de quarta (21/9), Fux sugeriu condições para a imposição desse dever à administração pública. O relator entendeu que a família deveria provar que não tem condições de pagar pelo ensino privado e que tenha pedido a matrícula previamente. Após ponderações de outros ministros, o relator excluiu as condicionantes.

Assim, foi aprovada a seguinte tese de repercussão geral (Tema 548):

1. A educação básica em todas as suas fases — educação infantil, ensino fundamental e ensino médio — constitui direito fundamental de todas as suas crianças e jovens, assegurado por norma constitucionais de eficácia plena e aplicabilidade direta e imediata;

2. A educação infantil compreende a creche, de zero a três anos, e a pré-escola, de quatro a cinco anos. Sua oferta pelo poder público pode ser exigida individualmente, como no caso examinado neste processo;

3. O poder público tem o dever jurídico de dar efetividade integral às normas constitucionais sobre acesso à educação básica.

Igualdade de gênero
Primeiro a votar na sessão desta quinta, o ministro Luís Roberto Barroso argumentou que a garantia de vagas em creches e pré-escolas beneficia mães que precisam trabalhar e necessitam ter um lugar onde deixar seus filhos.

O direito à educação foi reconhecido pela Constituição Federal de 1988, disse o magistrado. Desde então, já se passaram 34 anos e ele não foi concretizado. A única forma de mudar esse cenário é tornando tal direito efetivo pela via judicial, avaliou Barroso. Portanto, quem pedi-lo ao Judiciário deve recebê-lo.

O direito à creche e à pré-escola é subjetivo. Logo, cabe ao Estado garanti-lo, ressaltou a ministra Cármen Lúcia. Por sua vez, o ministro Ricardo Lewandowski destacou que tal garantia visa à inclusão social.

Decano da corte, o ministro Gilmar Mendes afirmou que assegurar vagas em creches e escolas transcende o interesse da crianças e alcança os direitos das mulheres, ajudando no acesso e na permanência delas, especialmente as mais pobres, no mercado de trabalho.

Nessa mesma linha, a presidente do Supremo, Rosa Weber, avaliou que interpretar a aplicação do direito à educação como discricionariedade do poder público desrespeita a Constituição e a igualdade de gênero, “cuja real implementação ainda é árdua batalha a ser vencida”.

Além disso, a ministra apontou que o dever do Estado de garantir educação infantil está vinculado à promoção da dignidade humana.

Competência do Executivo
No caso concreto julgado, os ministros negaram recurso extraordinário interposto pelo município de Criciúma (SC) contra decisões que o obrigaram a assegurar vagas em creches.

A cidade alegou que “o Poder Judiciário não pode imiscuir-se em tarefa típica da esfera de atribuições do Poder Executivo, impondo a destinação dos recursos a situações individuais e abandonando planos e metas administrativas traçados pelo município”.

Segundo a Procuradoria de Criciúma, “a disponibilidade de vagas em estabelecimento pré-escolar é meta programática que o poder público tem o dever de implementar na medida de suas possibilidades”.

O município também argumentou que “a Constituição Federal garantiu somente ao ensino fundamental a obrigatoriedade, conforme se depreende do seu artigo 208, parágrafo 1°. E tão somente a este (ensino fundamental) a previsão de acesso como direito público subjetivo, nada fazendo referência quanto ao ensino infantil”.

O procurador-geral da República, Augusto Aras, posicionou-se pela improcedência da ação. Segundo ele, é dever do Estado assegurar o atendimento em creche e pré-escola às crianças de até cinco anos, conforme diz o artigo 208, inciso IV, da Constituição.

Repercussão
Os advogados Guilherme Amorim Campos da Silva e Rubens Naves, por Rubens Naves Santos Jr. Advogados, que representam a Fundação Abrinq, amicus curiae no processo, afirmaram que “a decisão do Supremo Tribunal Federal reconhece ao conteúdo jurídico normativo constitucional do direito à creche caráter de norma autoaplicável e de eficácia imediata, impondo ao Estado dever de assegurar providenciar recursos orçamentários escalonados para sua realização no tempo”.

 

 

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